DIÁRIO DE BORDO.

Entre pedras, espinhos e incertezas desejantes: retomada a Miguel Leão

como forma de encontro ao mundo de reflexão ufológica.

 

Aristides Oliveira

11 de setembro de 2010... enquanto o mundo derrubava pela nona vez as torres gêmeas, minha empolgação desprezava qualquer lembrança de cidadão ocidental-padrão indignado com a fúria islâmica. Desliguei a TV e telefonei para o amigo Denes Filho para saber se ele estava a caminho: era hora de mais um embarque upupiano. Ele chega ao local acertado e ficamos na espera de Mardônio Jr, (pesquisador que vem ganhando destaque no grupo) que conduz o transporte até a região de Miguel Leão (PI).

Depois de tudo previamente planejado (laternas, barraca, comida, água, coragem...), saímos por volta de 13h30 para o local, o que ativou ainda mais a empolgação de todos, pois um dos grandes objetivos dessa viagem estava principalmente em rever nosso integrante e grande amigo Luís Ferreira, a dois anos distante da UPUPI devido nossas empreitadas na coleta de relatos ufológicos em Mandacaru-MA (2008-2009), que rendeu a série de entrevistas e vigílias disponíveis no site. Luís Ferreira ficou responsável por visualizar e mapear relatos de prováveis manifestações ufológicas enquanto percorríamos outros locais de investigação nesse intervalo de tempo.

Coordenado por Denes Filho e Mardônio Jr., que produziram uma pesquisa de sondagem e reaproximação na região (resultando no vídeo disponível na página inicial), seguimos a jornada.

Chegando ao município, Luís estava a nossa espera, pronto para mais uma longa caminhada. Após matarmos a saudade e prontos para seguir o destino, Luís nos leva a rota que direcionará ao ponto de vigília: Serra do Meio. Fomos obrigados a fazer um percurso maior como o de costume, pois o trecho convencional que trilhávamos virou propriedade privada, nesse sentido, nosso condicionamento físico nos coloca em condição crítica, além de subir uma serra com cerca de 300 metros de altura, o caminho para chegar lá apresenta uma série de dificuldades. Mata fechada, espinhos nas laterais da trilha, pouco espaço livre para caminhar e o mais difícil: chegar ao “pé” da serra antes de escurecer...

Vale lembrar que nesse trajeto tortuoso, visualizamos que a paisagem de Miguel Leão está muito prejudicada pelas queimadas, as plantações (fonte de renda para a maioria das famílias) estão parcialmente destruídas pelo fogo, deixando o ambiente seco e irrespirável, o que não impede dos agricultores continuarem sua luta para cuidar da terra, que segundo Luís, todos os dias ele e os amigos se reúnem para entrar no mato e apagar o fogo que se espalha rapidamente na região.

Depois de rever a paisagem desoladora que está se formando no local, conseguimos chegar à entrada que dá acesso a Serra do Meio, com mais um desafio: subir com as bagagens 300 metros com rapidez, o Sol está quase indo embora...

A subida nesse trajeto é aparentemente fácil de percorrer, mas chega um momento que temos de improvisar como “alpinistas tropicais” (fui um dos primeiros a declarar o fracasso pessoal da nova profissão, mas como gansos que voam em “V”, o companheirismo falou mais alto e recebi estímulo suficiente do grupo para continuar, com menos peso nas mãos, pude subir com relativa tranquilidade), exigindo alto esforço físico para atingir o topo da serra.

Chegamos lá em cima... a bela vista nos brinda com boas-vindas, o suor escorrido para atingir o melhor campo de visão mostra um vasto espaço aberto com um leque de possibilidades de observação noturna, com céu limpo e estrelas imponentes a nossa vista, estimulando mais uma noite upupiana de vigília e debate sobre a casuística que envolve o lugar.

Entre assuntos diversos, dos mais descontraídos aos ligados diretamente ao interesse de pesquisa, descobrimos a cada dia que ufologia de campo não se resume à ânsia precipitada em “ver-pra-crer” (mais direcionada aos amadores de pic-nic dominical), mas numa complexa relação com a cultura oral da região, em compreender a longo prazo os modos de ver e sentir de um grupo social que não sabe (assim como nós, pesquisadores em ufologia séria) o que significa os supostos avistamentos, que nos coloca em condição de igualdade com os depoentes, pois a falta de aparato metodológico concreto faz hoje dos ufólogos de campo meros experimentalistas, testando os princípios e limites em busca de evidências não apenas no céu, mas nas palavras, fonte fluida e muito imprecisa para tirarmos conclusões mais amplas.

Luís nos conta que foram registrados por ele poucos avistamentos relevantes (a maioria se resume a satélite, avião distante, balões metereológicos...), mas que há alguns meses atrás (ele não precisou por não lembrar a data) estava com um grupo de curiosos sobre o tema e eles visualizaram uma “luz” com tonalidade muito estranha, que passou com muita rapidez, não sendo possível um detalhamento mais claro, mas ele diz que os curiosos que viram o estranho objeto afirmaram ser algo fora dos padrões antes vistos. Segundo Luís, o período mais forte de aparições de ovnis na região aconteceu no período de 1998 a 2003, no qual é possível acompanhar em outros vídeos realizados pela UPUPI os detalhes desse período em particular.

Uma das questões que levantei na pesquisa pós-viagem foi sobre a postura do grupo em relação à vigília, pois esse ato é uma forma de refletir sobre as fronteiras que delimitam o fenômeno ufológico e os relatos prospectados durante longo período de investigação, que me faz perguntar: que aproximações podem ser feitas entre o ver o contar? Quais os limites entre as palavras enunciadas e o fato vivido? O que faz do Ver um ato que transforma o Ser? Os regimes de verdade que nos são (im)postos se cruzam com as verdades ditas? A vigília é um espaço de transformação ritual-individual ou devemos reduzi-la a uma proposta de observação laboratorial?

Voltei dessa retomada de pesquisa com mais perguntas do que respostas, o que caracteriza a investigação diretamente, pois não podemos trazer (e nem é de nosso interesse) o que o senso comum deseja: respostas vagas e sem cuidado reflexivo (como se fosse preciso apelar para a sociedade à existência “alienígena”) ou uma “nave” pousando na frente de nossas câmeras, com homenzinhos verdes saindo de suas engenhocas, equipados em roupas prateadas, nos amedrontando com seus longos tentáculos pegajosos, isso fica a cargo dos gerentes de marketing dos congressos e revistas ufológicas voltadas ao entretenimento adolescente.

A ufologia praticada pela UPUPI busca a construção do conhecimento na área com reflexões pós-coleta de dados, baseadas na vigília como espaço de compartilhamento de experiências e observações noturnas com entrevistas in loco, no qual precisamos deixar claro que nosso projeto enquanto grupo ufológico é uma investigação voltada para expor dados de uma suposta realidade ufológica nos eixos que trilhamos ao longo desses quase seis anos de união, para que possivelmente, após muito tempo de circulação, maturidade, mapeamento e segurança de nossas análises, seja possível dar alguma aproximação do que vem ocorrendo entre o Maranhão e o Piauí no âmbito ufológico.

Enquanto isso, o grupo disponibiliza seu acervo videográfico e relatórios de viagem, para que todos possam acompanhar o trajeto de nossas reflexões sobre o fenômeno ufológico nesse pedaço do Nordeste brasileiro, muito rico em mistérios e incertezas, mas com a persistência de todos nós em poder construir mecanismos para traduzir de modo minimamente legível os códigos ainda obscuros que cercam a casuística de Miguel Leão e seus arredores. Esse foi mais um passo dado de muitos. Que nossa retomada sirva de conexão para entender os cruzamentos entre todos os pontos em processo de investigação. Que as pedras não faltem nessa longa subida na serra da verdade ufológica!

 

Autor: Aristides Oliveira

Coordenadores da pesquisa: Denes Filho e Mardônio Jr.

Equipe na viagem: Aristides Oliveira, Denes Filho e Mardônio Jr.

Ilustrações: Flávio Tobler

Nucleo da UPUPI

Setembro de 2010

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